O derradeiro dia da inusitada pedalada de Carnaval
Escrito por: Rodrigo Martins em 31/05/2014

Na entediante assembléia da noite anterior, ficou acordado (pois bem, belo trocadilho!) que levantaríamos às 7h e para tanto foi aquela choradeira para me convencer. No quarto ao lado, um cavernoso ser roncava de forma tão estridente que as finas paredes de madeira vibravam angustiadas. Marcelo reclamando do nada suave grunhido incomodava mais do que o sinfônico urso e no fim, mesmo sem conseguir dormir, eu achava graça da situação. Ferindo o que já foi combinado a duras penas, o infeliz amigo levantou antes mesmo das 6h e por muito pouco não comecei a chorar. Permaneci por mais uma pequena porção de tempo estirado na confortável cama tentando me abstrair do furdunço alheio, olhando para o teto e contemplando o hipnotizante barulho do ventilador – quase me arrependendo de ter saído de casa para pedalar. Logo descemos para tomar café e foi aquele déjà vu dos infernos... outro tanto de tempo esperando ao relento o refeitório abrir. Não adianta explicar para o Senhor Alvorada, pois ele não entende que pessoas normais gostam de dormir até um pouco mais tarde – ainda mais numa segunda-feira de carnaval. Ou quem trabalha no convento não tem direito de festar? Novamente não tinha Nescau, então pouco valeu a espera e nem dei muita bola para o minguado que foi servido. Me apressei e logo segui para o quarto arrumar as tralhas pela última vez nessa viagem. Fazia um pouco de frio e nem o antipático morro inicial conseguiu esquentar as nossas carcaças. Não tínhamos pressa e passeamos por cerca de sete quilômetros pela mesma 281 de sempre até enveredarmos por uma estradinha que sequer sabíamos que existia.

Com o sol entre as nuvens e a estrada bacana ganhando formas estranhas, começamos a subir consideravelmente. Mais a frente, mas não muito, uma placa emblemática assustou e momentaneamente desanimou os desconfiados aventureiros: “Rua sem saída”. Na dúvida entre confiar na tal placa ou no GPS fanfarrão, esperamos por alguma boa alma que pudesse nos passar a letra certa. Pouco tempo depois, um apressado e simpático senhor que seguia estrada em seu possante caminhão e que gentilmente parou para nos socorrer - afirmou para não nos preocuparmos e que poderíamos seguir adiante tranquilamente. E, assim o fizemos. Alguns quilômetros avante, reencontramos o camarada na frente de sua isolada casa e conversamos um tanto mais, aproveitando o singelo momento para mendigar um pouco de água. De caramanholas enchidas, nos despedimos e seguimos caminho. A água nos foi servida numa garrafa de Fanta Uva, aromatizando de forma estranha a gelada bebida. De qualquer maneira, com a sede que estávamos, foi a melhor pior água que já bebemos – não resta dúvida. Alguns metros à frente passou por nós um estranho garoto com uma bicicleta sem pneu, apenas no aro – consideravelmente mais rápido que nós, o que nos fez franzir a testa. Será? Pensamos rindo aos montes...

Contornamos algumas cercas dessas que sempre nos perseguem até que em determinado momento começamos a descer... e, descemos muito! Descemos tanto que chegou a ficar monótono. Chato a tal ponto de nos fazer sentir falta de uma leve subidinha. Jamais imaginei que um dia iria reclamar de uma longa descida, jamais! Filosoficamente concluímos que tamanha blasfêmia só poderia ser efeito daquela água psicodélica que nos foi servida em tom de refrigerante roxo. Chegamos a Águas Mornas por volta das 13 horas, já pensando aonde iríamos almoçar. O primeiro restaurante que avistamos estava lotado, o que nos fez passar direto – deixando o destino nos guiar até o restaurante da Família Cunha: onze pila livre, sendo praticamente desnecessário dizer que foi aquele estrago. Pelo WhatsApp mantínhamos os amigos informados da nossa façanha ao passo que passávamos as coordenadas para o pai do Marcelo vir nos resgatar. Sentados ao meio-fio, já com tudo desmontado, esperávamos apenas o guincho amigo enquanto descansávamos a pança. Sem chuva e nenhum pneu furado, sequer conseguíamos esconder o sorriso de satisfação de completar outra divertida brincadeira. Churrasco marcado para mais a noite e depois era só matar a saudade da estimada cama de casa. Ou não, afinal de contas... ainda era Carnaval!

Valeu cada quilômetro pedalado nesse inusitado retiro espiritual ciclístico montado nas nossas sofridas bicicletas. Ouvidos limpos com Ramones, Toy Dolls & Cia... e, agora com o espírito renovado, coçando o cocuruto pensando no que fazer no próximo feriadão. Para encerrar, videozinho curto e bacana do que foi feito nesses três dias de viagem:

Terceiro dia de três: encerramos mais uma divertida cicloviagem saindo de Angelina e indo parar em Águas Mornas – descendo o tanto quanto foi possível por uma bela e desconhecida estradinha de chão – até reencontrarmos o guincho amigo que gentilmente nos deixou na porta de casa sem precisarmos pedalar por aquele trecho horroroso da 282.

Comentários
Seg, 16 de junho de 2014
Por: Waldson Gutierres dos Santos
Esse pedal... essas belas paisagens só fazem aguçar ainda mais essa minha "inveja" tão saudável!

Parabéns & Parabéns!

Grande cicloabraço do Antigão cicloturista!
Ter, 03 de junho de 2014
Por: Eleonésio Diomar Leitzke
Muito show meus amigos.
Ainda continua faltando o pedal em conjunto(com exceção ao menos do Roberto que vou encontrar na minha categoria na Pedra branca no domingo) e tb a tão falada pizza.

Um grande abraço.
Seg, 02 de junho de 2014
Por: dorgivan santos.
Como sempre uma linda trip e bem contado relato, uma subidinhas leves e o um grande humor de vcs.

abçs.